domingo, 29 de novembro de 2020

Carruagem Fantasma de Ana Jansen – Folclore Brasileiro

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Carruagem Fantasma de Ana Jansen  Folclore Brasileiro

        A personagem política e empreendedora de Ana Jansen, também conhecida como Donana, ficou marcada de forma emblemática e controversa, tanto na história, quanto no imaginário do Brasil. Descendente da nobreza europeia, instalada em São Luís, na então província do Maranhão, conta-se que foi expulsa de casa pelo próprio pai, ainda adolescente, severamente julgada como uma mulher desonrada após gerar um filho de paternidade desconhecida. Sem dinheiro e com um recém-nascido para criar, ela precisou reunir forças para seguir em frente.
     Desamparada, Ana Jansen passou por um período muito difícil, até conhecer um riquíssimo coronel chamado Izidoro Rodrigues Pereira. Ela foi sua amante por muito tempo, morando em uma casa cedida por ele. Os dois tiveram cinco filhos, e, após a morte da esposa de Izidoro, casaram-se e tiveram mais uma filha.
     Depois de 15 anos juntos, com o falecimento do marido, Ana Jansen passou a controlar os negócios da família, dispondo da maior produção de algodão e cana-de-açúcar do Maranhão – uma das maiores de todo o norte* do Brasil Império. Como uma grande empresária, passou a vender terras improdutivas e comprar imóveis, triplicando e aproveitando o patrimônio herdado. Nessa época, em pleno século 19, também ganhou o apelido de Rainha do Maranhão, assumindo uma liderança política na região e aliando-se com grupos opositores ao Partido Conservador.
     Embora exercesse uma notável influência sócio-política, uma mulher contestadora e com tamanho poder não era bem vista pela sociedade moralista da época. Para piorar, mais uma vez, ela havia se tornado amante de um homem rico, o desembargador Francisco Vieira de Melo, com quem teve mais quatro filhos. Assim, cercada de inimizades e olhares de julgamento, ficou sentenciada não apenas como uma figura autoritária, mas também como um retrato da depravação.
     Com isso, já bastante mal falada, também começaram a circular histórias sobre uma face sádica de Ana Jansen, atribuindo a ela incontáveis atrocidades contra seus numerosos escravos. Onde ela até mesmo caminharia sobre eles para entrar em seu grandioso casarão – existente até hoje e, segundo os ludovicenses, impregnado de assombrações –, simplesmente para não pisar no chão com seus tamancos requintados. Em meio a fatos e rumores, a verdade é que todos esses elementos contribuíram diretamente para gerar muitas lendas acerca de Ana Jansen, sobretudo após a sua morte, em abril de 1869.
     A lenda mais famosa conta que, para pagar os seus pecados, a alma de Ana Jansen foi condenada a vagar perpetuamente por São Luís; partindo de um cemitério, nas noites de quinta para sexta-feira, em uma carruagem fantasmagórica. Terrivelmente conduzida por um escravo sem cabeça, de corpo ensanguentado, e puxada por diabólicos cavalos decapitados, que marcham mediante um aterrorizante trote do além.
     Dentro da carruagem encontra-se sentada Ana Jansen, toda vestida de preto, exibindo o poderoso brasão de sua família no pescoço. Surge carregando uma vela acesa, que entrega para as desafortunadas testemunhas de seu trajeto. Narra-se que na manhã do dia seguinte, como um ameaçador alerta aos notívagos passeantes, quando não rezam pela alma da matrona, a vela transforma-se num artefato mórbido: um osso de defunto.
     Ainda hoje, sob o luar nordestino, na hora mais silenciosa da noite, iniciado como um leve sussurro nas trevas, pode-se ouvir uma batida de cascos nos paralelepípedos das ruas do centro de São Luís. Um som que aumenta. Propagando-se como a escuridão. Acompanhado pela penosa toada das rodas daquela carruagem luxuosa e maldita. Onde nem o taciturno canto de um urutau poderia causar mais angustia aos moradores do que tal ressoar espectral.
        

* As divisões e incorporações regionais daquele período eram diferentes das atuais.

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