sábado, 7 de novembro de 2020

Jagua-ru – Mitologia Guarani

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Jagua-ru  Mitologia Guarani

       Batalhas históricas que marcam o passado; sítios arquitetônicos que conservam-se no presente. Com mais de 27 mil habitantes, e localizada no estado do Rio Grande do Sul, a cidade de Jaguarão teve origem em um acampamento militar por volta de 1802. Seu território já foi palco de inúmeros confrontos em disputas portuguesas e espanholas, refletidas em sua fronteira com o Uruguai. Inclusive, Jaguarão recebe a poderosa alcunha de “Cidade Heroica”, pois teve papel fundamental durante a Guerra do Uruguai, na chamada Batalha do Jaguarão, que foi travada em 1865. As forças jaguarenses resistiram bravamente a uma intensa invasão, mesmo em menor número. Cerca de 500 praças fizeram 1500 uruguaios baterem em retirada.
       Hoje os tempos são outros, muito mais pacíficos. A cidade é ligada ao país vizinho (diretamente até Río Branco) através de seu grande cartão-postal, a Ponte Internacional Barão de Mauá, composta por torres monumentais que evocam uma fortaleza imponente – reconhecida como primeiro patrimônio cultural do Mercosul. Tal ponte atravessa o homônimo rio Jaguarão, que dá nome à cidade; e assim foi batizado por conta de uma brutal criatura mitológica conhecida como Jagua-ru, que habitaria suas redondezas impregnando uma aura fantástica no local.
       A figura do Jagua-ru é intrínseca à história da cidade gaúcha, está presente até mesmo no brasão do município. Recolhendo informações com os moradores, também verifiquei que aprendem sobre a lenda já nas escolas. Essa criatura quimérica e terrível é descrita com o tamanho de um cervo, corpo de lobo-marinho – ou cauda de peixe, em algumas raras versões –, cabeça e patas dianteiras de onça, e coberta por uma pelagem espessa.
       De acordo com a Mitologia Guarani, o Jagua-ru ficava à espreita entre as barrancas, aguardando por suas presas. No mais ínfimo sinal para agir, começava a escavar com suas garras violentas, provocando desmoronamentos próximos às margens dos rios. Fazia isso de forma ardilosa, para derrubar suas vítimas na água, avançando freneticamente até elas com sua bocarra repleta de dentes. Curiosamente a fera não devorava sua caça por completo, arrastava o corpo humano ou animal para fora da água, e apenas extraia o pulmão para deleitar-se, arremessando o restante de volta para o rio.
       A lenda do Jagua-ru também percorre por outros rios e países sul-americanos. Justamente por conta de sua origem nas terras dos guaranis, que hoje são demarcadas por fronteiras. O monstro está presente nos folclores de Argentina, Paraguai e Uruguai, onde é chamado de Yagua-rón, ou Yaguarón; apresentando o mesmo histórico de destruições nas ribanceiras e apetite por pulmões. Mas, por essas áreas, sua descrição física traz variações: é narrado como um grotesco lagarto com cabeça de cachorro.
       Ainda sobre o bestiário de nossos países vizinhos. O antropólogo Adolfo Colombres, em sua obra “Seres Sobrenaturales de La Cultura Popular Argentina” (1984), também fala sobre uma criatura chamada Teyú-Yaguá, ou Teju-Jagua, presente unicamente na região missionária argentina e no Paraguai; que, dentre algumas descrições, poderia variar de um monstro com características aquáticas, até um enorme lagarto com sete cabeças de cachorro. Esta versão, com as sete cabeças, é bastante popular no Paraguai, pois foi inserida na narrativa dos filhos de Tau e Kerana, difundida pelo poeta Narciso R. Colmán em sua obra “Nuestros Antepasados”, publicada em 1937. Assim, podemos considerar o Teyú-Yaguá também como uma diferente representação do Yagua-rón, ou um outro ser, mas com uma provável mesma origem lendária.
       Voltando ao Brasil. Há tempos que o Jagua-ru não aparece por aqui. Talvez ainda esteja pelas barrancas de Jaguarão, porém, agindo silenciosamente. Resistindo às investidas e armadilhas que não podem conter seu ímpeto ancestral.

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