A história caipira nasceu com o bandeirismo, no século XVI, onde povoados foram
abertos e fundados pelas áreas desbravadas. Ajudando, com o tempo, a construir um modo de
vida baseado na criação de animais e no cultivo de terra. Alheios aos termos pejorativos, é
necessário reconhecer e valorizar a cultura caipira, que é raiz de muitas das populações
interioranas do Brasil.
O termo “caipira” tem origem no tupi, pela chamada língua geral paulista, formada na
Capitania de São Vicente. Pode-se dizer que as regiões que ambientam de modo mais intenso
tal cultura estão abrigadas nos estados de São Paulo, Paraná, Goiás, Minas Gerais, Mato
Grosso e Mato Grosso do Sul.
Apesar do riquíssimo valor das particularidades, muitos traçam paralelos entre o estilo de
vida caipira com o gaúcho*, no Rio Grande do Sul, e com o sertanejo, no Nordeste, que
também são ligados à agricultura e à pecuária. O último, é compreendido em parte de Minas
Gerais e Espírito Santo, além dos sertões de Bahia, Alagoas, Pernambuco, Rio Grande do
Norte, Paraíba, Piauí, Sergipe e Ceará, assim como parte do Maranhão; sendo um povo que
enfrenta bravamente as zonas secas do país para o seu gado e cultivos específicos.
Pela imensidão brasileira, o povo se espalha e se mistura. Com isso, nos mitos e ritos das
tradições citadas anteriormente, observa-se uma forte ligação com a natureza e um teor
religioso, este herdado dos europeus, mas que também encontram manifestações indígenas e
africanas. Um sincretismo que vai desde as benzeduras até as histórias sobrenaturais de
lobisomens, assombrações e outros causos.
Voltando à cultura popular caipira, o pesquisador Antônio Carlos Affonso dos Santos, em
seu livro “Pequeno Dicionário de Caipirês”, de 2001, nos traz um capítulo todo dedicado às
criaturas do folclore caipira brasileiro. Dentre elas, se destacou para mim um ser pouco
conhecido, mas intrigante: o terrível Maçone.
Alto, e possivelmente bípede, o monstro é todo vestido de ferro zincado. Tem carranca de
caprino e focinho comprido, com chifres recurvados e pontiagudos. Sua característica mais
peculiar está no par de olhos, feitos de guloseimas, como tortas doces. Dizem que o bicho
mítico pode se transformar num bode preto nas altas horas da noite, vagando à procura de
vítimas para devorar, com uma cruel preferência por recém-nascidos.
Para adquirir mais informações sobre a lenda, e melhor situá-la no território brasileiro,
entrei em contato com o referido pesquisador. Ele cordialmente me respondeu, disse que a
coletou a partir dos relatos de sua avó, nascida e criada no interior de Minas Gerais, em
Penido, na região de Juiz de Fora. Contou ainda, suspeitar que a origem do mito do Maçone,
possivelmente no século XVIII, seja uma distorção da figura dos maçons, alvos de
desinformação e de inúmeras invenções, gerando um equivocado medo na população,
temerosa ao oculto.
Continuando minha pesquisa, constatei que o mito também é contado e temido pelos
antigos no interior do Nordeste, sobretudo no Ceará. Levando em conta Minas Gerais e a
ligeira fronteira de Juiz de Fora com o Espírito Santo, e claro, o elo mineiro com a região
Nordeste, o mito parece se desenhar como uma espécie de confluência da cultura caipira e do
povo sertanejo.
Sendo assim, no interior mineiro ou nordestino, pode-se recear e aguardar pela besta
metálica; pois o Maçone irá entranhar-se pelas sombras com o seu corpo de armadura
resistente. Aos passos dos cascos de ferro nas trevas do anoitecer. Infeliz será aquele fitado
pelas esferas açucaradas do bode que assombra.
Caio Sales é ilustrador e escritor. Pós-Graduado em Marketing pela PUC-Campinas; Pós-Graduado em Sociologia, História e Filosofia pela PUC-RS. Também é membro da Associação de Escritores de Bragança Paulista (ASES) e da Associação Brasileira dos Escritores de Romance Policial, Suspense e Terror (ABERST). @caiosales_art