Ícones da Costa Rica, os
multicolores carros de bois de duas rodas, também conhecidos como las carretas,
exalam euforia e arte com suas cores vivas e pintadas a mão, embelezando as
ruas e os caminhos rurais do país, transportando principalmente café. Essa
tradição de decorar os carros de bois é passada de pai para filho, tornando-se
parte essencial da cultura costa-riquenha, agindo também como uma representação
de sua forte agricultura. No entanto, todo o colorido alegre desse meio de
transporte contrasta com uma obscura e assombrosa história que também envolve
um carro de bois, ou melhor, um carro sem bois, a lendária e profana Carreta
Sin Bueyes.
Percebe-se uma forte
presença de seres fantasmagóricos e de bruxas no folclore da América Central, e
nesta lenda não é diferente. Com diversas versões da história da Carreta Sin
Bueyes, uma delas fala sobre um desejo proibido de uma bruxa por um homem muito
religioso.
Diz a lenda que na antiga
San José – capital da Costa Rica –, em meio a vilarejos e ruas desniveladas,
vivia uma bruxa, que nutria uma paixão singular pelo rapaz mais belo da cidade.
O rapaz era um cristão fervoroso, bastante devoto, e a figura horrenda da bruxa
não lhe despertava sentimento algum que não fosse medo e repulsa. Todavia, após
algum tempo, ele foi enfeitiçado por ela, apaixonando-se perdidamente por
aquela que até então condenava.
A notícia da relação dos
dois logo espalhou-se, ganhando a reprovação de todos, sendo considerados
pecadores pelo padre local, que passou a pregar constantemente contra essa
união. Após um longo tempo vivendo juntos e reclusos, o rapaz envelheceu e
adoeceu; ele já havia se tornado um ser tão horrendo quanto a própria bruxa.
Mesmo enfeitiçado, aquele homem mortiço mantinha sua fé cristã, e assim seria até
os últimos dias de sua vida. Dessa forma, diante daquela doença incurável, fez um
último pedido à bruxa. Pediu para que quando morresse recebesse os sagrados ofícios
da igreja da cidade.
Ela atendeu ao pedido e,
já prevendo a morte de seu amado, foi conversar com o padre; porém, o mesmo foi
irredutível e negou veementemente o pedido. Voltando desolada para seu lar, não
demorou para a bruxa ver o amor de sua vida sucumbir ao gélido abraço da morte.
Enfurecida pela negativa do padre, colocou o caixão com o corpo de seu marido
em um carro de bois, e ordenou aos animais que partissem em direção à igreja. A
bruxa seguiu junto deles, empunhando um facão em uma mão e uma vassoura em
outra. Ensandecida, dirigiu-se instalando um clima denso pela cidade.
Os bois seguiram em
disparada, mas quando chegaram à porta da igreja encontraram o padre, que
bradou: “Em nome de Deus, parem!”. Instantaneamente os animais pararam e ali
permaneceram, porém, a furiosa bruxa prosseguiu blasfemando contra o sagrado. Escolha
perversa e irreversível. Os obedientes animais foram perdoados pela graça
divina, mas a bruxa e seu finado marido foram condenados a perambular como almas
melancólicas e pecaminosas, vagando eternamente e sem perdão em seu amaldiçoado
carro de bois. Ainda hoje, no terrível silêncio da escuridão, pode-se ouvir o
som de suas rodas gastas e envelhecidas, numa toada lenta e triste, sem
qualquer animal puxando-o, enquanto vagueia pelas ruas de San José.